Alfabetização de crianças: eis um tema que costuma estar coberto de mitos, receios e insegurança por parte dos pais, cuidadores e educadores.
O porquê de termos tanta pressa para que os pequenos aprendam a se comunicar é um assunto que aparece com frequência nas conversas de família.
Hoje, sabe-se de pelo menos quatro linhas de pensamento sobre os métodos de alfabetização: a do processo global (aprende-se a ler frases inteiras); a do método fônico (aprende-se metodicamente sons e letras); a que aproveita conceitos das duas anteriores; e por último a que acredita que tudo depende do professor, não importando o método.
Pensando em mensurar a capacidade de ler e aprender em números, os Estados Unidos e a Inglaterra criaram uma iniciativa chamada “Literacy Panel”, responsável por organizar todos os estudos sobre o tema, a fim de aprimorar suas práticas.
Porém, mesmo diante de toda essa literatura sobre o assunto, há apenas uma pequena porção dela que se provou verdadeiramente eficiente na prática.
Seja como for, o Literacy Panel permite concluir que o método fônico se destaca dentre os demais. É melhor primeiro aprender a ler bem e depois dedicar-se a entender o que está escrito.
Observou-se também que, quanto mais dificuldades de aprendizado o aluno tiver, mais o método fônico traz vantagens.
Há uma ressalva que deve ser feita: antes de adotar um método de alfabetização, é preciso considerar o contexto de cada ambiente de ensino e do professor que irá colocá-lo em prática, para garantir que o profissional tenha facilidade com seu objeto de trabalho.
Ou seja, conhecer a realidade e condições de trabalho de cada escola ou professor é tão importante quanto ter parâmetros internacionais de funcionalidade do aprendizado.
Mas, afinal, o que é a alfabetização?
O psicolinguista colombiano Evelio Cabrejo Parra, explica que adquirimos a linguagem já na primeira infância, quando bebês, e associa a ‘alfabetização’ a um processo anterior à fala e à escrita.
“O bebê, ao nascer, já vem com a capacidade de escutar. Quando se lê para ele em voz alta ou se canta uma canção de ninar, ele se põe em posição de escuta. Isso quer dizer que ele está tratando de construir significado à sua maneira”.
Já a escritora e ilustradora infantil Patricia Auerbach ressalta como o próprio conceito do que é ‘ler’ é insuficiente.
Segundo ela, a alfabetização e a leitura na educação infantil focam somente no texto, deixando de lado o potencial de leitura de imagens.
“Se a gente só alfabetizar para a palavra, a criança não vai dar conta de decodificar o mundo, que é muito visual”, explica Patricia em entrevista ao blog Garimpo Miúdo.
Patricia é autora de diversos livros ilustrados infantis, como “O jornal” (Brinque-Book) e “Coisas de gente grande” (Cosac Naify).
Seja como for, o fato é que a maioria das pessoas tem a capacidade da linguagem tão introjetada no dia a dia que é fácil esquecer como foi lento e gradual adquiri-la.
Antes de generalizar o aprendizado das palavras ou apressar a alfabetização, é preciso ter em mente que a leitura de mundo dos pequenos acontece de muitas maneiras.
Um bebê, por exemplo, lê com o corpo, com os ouvidos, com as mãos, a partir da exploração tátil, sonora e visual das coisas.
Para a criança dominar a escrita
De acordo com a psicóloga e pedagoga Betty Monteiro, o processo formal de alfabetização deve começar a partir dos sete anos de idade.
Para ela, trata-se de um marco que deve ser respeitado, pois, nessa idade, o sistema nervoso já está amadurecido e as células nervosas estão mielinizadas, ou seja, com uma camada que as amadurece e as deixa prontas para absorver essas informações.
Além disso, para dominar a escrita, é preciso trabalhar, a partir de atividades de alfabetização com a criança, a coordenação motora fina, a noção de tempo e de espaço, o saber se reconhecer e reconhecer o outro, conseguir decodificar símbolos, ter boa percepção visual e capacidade de discriminar sons.
“Antigamente chamávamos isso de prontidão para a alfabetização, requisitos básicos. Mas a criança deve estar pronta. Antes disso, a Educação Infantil tem um papel fundamental, por ser um período preparatório físico, sensorial, emocional e psicomotor. Ela é decisiva para o sucesso escolar da criança”, explica Betty.
Aplicativos podem te ajudar na alfabetização de crianças
Em um país em que o índice de analfabetismo da população é de 8,5% em 2013, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), métodos tecnológicos para ajudar no aprendizado são bem vindos.
Por isso, nasceu o Palma (Programa de Alfabetização na Língua Materna), uma iniciativa que propõe o uso de smartphones e tablets com um aplicativo educacional cujo objetivo é estimular e complementar as habilidades de leitura, escrita e compreensão de textos.
Seguindo recomendação da Unesco de utilizar tecnologia móvel para obter melhores resultados na escola, o Palma combina sons, letras, imagens e envio de dados. Há cinco níveis de dificuldade: alfabeto, sílabas simples, sílabas complexas, universo vocabular e leitura e compreensão de textos.
O app Palma Escola foi desenvolvido e pautado na tabela de diretrizes e competências do MEC – Ministério da Educação – que trata do 1º Ciclo de conteúdo da alfabetização. Ele é utilizado em sete municípios do Estado de São Paulo com 600 alunos da EJA – Educação de Jovens e Adultos.
Em 2014, 2015 e 2016 , o programa foi testado também com crianças na faixa etária de seis a dez anos, apresentando aceleração da aprendizagem e diminuição da evasão dos alunos.
A plataforma também gera relatórios de gestão da aprendizagem e contém 4.200 atividades de aprendizagem em 937 palavras, 1.221 frases, 54 categorias de palavras e 34 textos.
Alfabetização de crianças autistas
Para auxiliar no processo de alfabetização de crianças com autismo, pais e educadores agora podem contar com um ajudante no estímulo da linguagem e alfabetização das crianças portadoras do transtorno do espectro autista (TEA): o aplicativo Brainy Mouse (Rato Inteligente ou Rato Atrevido).
O app, fruto de quatro anos de pesquisas, poderá ser usado em celulares e tablets, disponível para Android (Google Play) e iOS (Apple Store), e será no formato de jogo. Assim, de forma lúdica, vai ajudar as crianças no processo de aprendizagem.
Um dos maiores desafios na educação das crianças com autismo é o desenvolvimento da linguagem. Assim, o jogo pretende trabalhar justamente esta questão.
De acordo com um estudo divulgado pelo Center for Disease Control and Prevetion, órgão ligado ao governo dos Estados Unidos, no Brasil existem três milhões de autistas – uma incidência de uma a cada 68 crianças.
É preciso olhar para estes números e para o que eles representam – os desafios, as dificuldades, as particularidades e o impacto social.
Uma das principais questões trabalhadas no game, de forma inconsciente, é a atitude de pedir ajuda ao próximo, e assim estimular essa ação no dia a dia.
Como recursos, o app adota a leitura da esquerda para direita, formação de palavras usando sílabas, interação com cores, sons e outros “dispositivos cognitivos”. De forma interativa, a criança pode customizar seu ratinho, além de ser desafiada a conseguir “cheesecoin”, uma espécie de moeda virtual.
A ideia surgiu em 2013, quando a pesquisadora Ana Sarrizo pensava apenas em contribuir com os portadores de TEA de Belo Horizonte, sua cidade natal. No entanto, os resultados foram tão positivos que um professor de Ana a aconselhou inscrever no prêmio Santander.
O resultado foi um sucesso: a ideia foi vencedora, dentre 17 mil outras propostas voltadas para a educação. Com a premiação de R$ 100 mil e uma bolsa no curso de empreendedorismo da Babson College, a autora do projeto decidiu criar a Brainy Mouse Foudation, nos Estados Unidos.
O objetivo da Fundação é ajudar instituições do mundo inteiro, familiares e educadores, que já trabalham com crianças e adultos com TEA, produzindo games e ferramentas que vão auxiliá-los no seu progresso dia a dia.
Nenhum comentário:
Postar um comentário